SANDRA FELZEN
O TEMPO, O FEMININO, A PALAVRA - CRISTIANA TEJO
Curadora
Rio de Janeiro, maio de 2025
BRASILEIROS EM FLORENÇA - RUY SAMPAIO
Curador
Rio de Janeiro, fevereiro de 2019
PAISAGEM IMERSA - JAIR DE SOUZA
Designer e Diretor de arte
Rio de Janeiro, dezembro de 2016
CONSERVAÇÃO E MUDANÇA - GRACIELA KARTOFEL Historiadora de arte, Curadora e Crítica
Nova York, junho de 2009
Jornalista
Rio de Janeiro, 2006
Artista, Professora e Doutora do Centro de Letras e Artes da UNIRIO
Rio de Janeiro, 2004
MUITO AQUÉM E ALÉM DO JARDIM - ORLANDO MOLLICA
Artista plástico e Professor da Escola de Artes Visuais
Rio de Janeiro, maio de 2001.
Crítico de arte
Rio de Janeiro, outubro de 1997
A TELA, TERRA DA ARTE - ARMANDO MATTOS
Artista plástico
Rio de Janeiro, outubro de 1991
Curador, Crítico e Professor do Departamento de Artes do City College
Nova York, maio de 1989
ESTUDOS E PINTURAS - AVRON J. SOYER
Artista plástico e Professor de pintura da New School
Nova York, julho de 1986
O TEMPO, O FEMININO, A PALAVRA
Sandra Felzen nos convida a atravessar o tempo com ela. Mas não o tempo cronológico, da sucessão apressada de dias, e sim o tempo da escuta, da maturação, da revelação. Na exposição O Tempo, o Feminino, a Palavra, a artista entrelaça décadas de criação artística com saberes ancestrais, espiritualidade e uma escuta do tempo interno e do mundo. Trata-se de uma obra em camadas — como as árvores que pinta —, construída em ciclos, costurada em silêncio e revelada no gesto amoroso da artesania.
No centro da mostra está um livro-objeto que nasce de um útero de crochê. A capa tricotada, as palavras em hebraico, os relatos de mulheres bíblicas e os autorretratos reunidos desde os anos 1980 criam um organismo poético. Nele pulsa a memória da artista, sua história e sua observação atenta às palavras. A esse núcleo íntimo, circundam doze cestos de crochê - recipientes que remetem ao tempo e aos meses, à fertilidade, à prática cuidadosa de recolher fragmentos e conter sentidos. Como nos ensinamentos cabalísticos evocados por Sandra, os cestos seriam também os vasos que tentam reter a intensidade do sagrado - mesmo que essa contenção seja sempre parcial, precária, fraturada.
Os cestos, aliás, também se encontram numa situação de centralidade na exposição. Como nos ensinou Ursula K. Le Guin, a narrativa do recipiente - o cesto que carrega, que guarda, que acolhe - é tão ancestral quanto invisibilizada pelas narrativas heroicas da cultura ocidental. Ao trazer esses objetos à cena, Sandra reivindica um outro tipo de saber: o saber do cuidado, da continuidade, da escuta silenciosa que resiste ao apagamento. A cesta torna-se metáfora da criação como sustentação - da vida, da memória, da espiritualidade.
As árvores que habitam a exposição são conselheiras e testemunhas. Pintadas em grandes formatos, elas se erguem com força e serenidade, sugerindo um eixo que liga céu e terra, presente e ancestralidade. São também metáforas da própria artista, que tece, pinta, escreve e borda em camadas — criando uma poética que é simultaneamente forte, calma, passional e pacífica, como ela mesma define as árvores em uma de suas séries.
Sandra Felzen não separa arte da vida, nem pintura de expressão têxtil. Sua obra é travessia entre linguagens e tempos. O útero - como espaço simbólico e físico de criação - torna-se metáfora central. Como aponta a artista, em hebraico, útero é Rechem, palavra que partilha raiz com Rachamim, compaixão. Assim, ela conjuga gestar, tecer e criar não apenas como verbos da arte, mas também do cuidado com o mundo. Esta é uma exposição feita de palavras e silêncios, de tecidos e raízes. Ao articular autobiografia, mito e tradição, Sandra Felzen nos convida a revisitar a história do que é considerado feminino não como um lugar de submissão, mas como território de revelação, força e criação.
CRISTIANA TEJO
Rio de Janeiro, maio de 2025